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terça-feira, 4 de abril de 2017

Em plena seca, famílias do Sertão de PE mantêm plantação verde com ‘bioágua’

No Sertão de Pernambuco, Manoel e Maria Gercília produzem acerola, goiaba, banana, pinha e romã apesar dos quase cinco anos de estiagem na região. A família, que reside na comunidade de Sítio Santa Fé, na Zona Rural de Santa Filomena, uma das 36 cidades pernambucanas em estado de emergência pela seca, tem conseguido manter o verde da plantação graças ao sistema de ‘bioágua’, uma tecnologia que reaproveita as ‘águas cinzas’, usadas no chuveiro e na pia da cozinha, para a irrigação de plantas frutíferas e hortaliças.
Maria Gercília Alves da Silva tem 56 anos e há 33 anos é casada com Manoel Pereira Barros, de 58 anos, mais conhecido como ‘Nequinho’, com quem teve oito filhos. Há dois anos, a propriedade do casal em Santa Filomena recebeu da ONG Caatinga um bioágua familiar. O sistema possibilita o reúso da água através de um processo de filtragem.
A partir do sistema, 130 litros de água gastos em média pela família passaram a ser levados para irrigar a plantação. “Antes, a gente estava comprando água, e uma carrada de água estava R$70. Não tinha condição de comprar para molhar as plantas. Nós tínhamos uma plantação de banana que se acabou. Agora, ficaram só as outras plantas, as goiabeiras, acerola, graviola e pinha, e nós sustentamos essas plantas com a água do bioágua”, conta a agricultora.
Segundo Manoel, é o sistema que mantém a plantação viva. “Começou em 2014. Eu achava difícil, mas depois de montado, eu vi que era mais fácil. O biágua é uma ajuda boa, conseguimos plantar umas goiabas, pinha, romã e acerola. A gente vende e dá uma renda. Se não fosse o biágua, não sei como a gente estava passando com essa seca”, ressalta.
O sistema do biógua funciona de forma simples: a água que é utilizada pela família no banheiro e na pia da cozinha é canalizada para uma caixa de coleta de gordura. Em seguida, a água da caixa é direcionada para um cano em formato de ‘garfo’. A sujeira é decantada, e a água goteja em um primeiro filtro com um metro de profundidade e um metro e meio de diâmetro. O filtro possui cinco camadas de materiais diferentes :pedras, cascalho de pedras, areia, pó de serra, húmus de minhoca e carvão. Depois de filtrada, a água segue para o segundo tanque, que tem um motor que bombeia o líquido para as mangueiras que irrigam a plantação.
Já foram instalados 20 bióguas no Sertão do Araripe. De acordo com a técnica de campo da ONG Caatinga, Kátia Rejane Holanda Lopes, a tecnologia foi trazida para a região através de um intercâmbio com o projeto Dom Helder Camara, no Rio Grande do Norte. “Em 2012, a ONG Caatinga reuniu um grupo de famílias de agricultores e levou para o Rio Grande do Norte, que já tinha a tecnologia implantada, para conhecer e aprender a fazer o sistema. Na volta da viagem, foram construídos dez bioáguas em várias comunidades. [Instalamos] mais dez em um projeto que a gente trabalhou com jovens”, explica.
A implantação de um biógua familiar custa em torno de R$5 mil. Segundo a técnica de campo, é uma tecnologia relativamente barata. A ONG faz a captação de recursos através de editais de projetos. “Durante o período da seca, muitas famílias deixam de produzir porque não tem água. O bioágua dá condição de que elas aproveitem a água que naturalmente elas já usariam”, afirma.
A expectativa é que agora seja adaptado um grande bioágua na Escola Rural Ouricuri , e que 414 alunos possam se beneficiar com as hortaliças irrigadas pela água do sistema. A implantação já aconteceu em 2015, mas o equipamento precisou de mudanças por causa da grande produção de água do local. “Nós usamos por uns seis meses, mas começou a surgir problema por por conta da produção de água excedente. Agora, a gente está repensando [o sistema] com a ONG Caatinga para que ele volte a funcionar”, relata a gestora da escola, Ana Paula da Silva.
“Quando se fala em tecnologia, as pessoas pensam em celular, em computador, mas essa é uma tecnologia de captação, tratamento e reúso de água cinzas”, explica o professor Joseilton Texeira Salviano, que participa da implantação do bioágua. “São produzidos em torno de 300 litros de água por dia. A caixa [de gordura do sistema] não comportava essa produção, então a gente quebrou e desativou para fazer adaptações”, esclarece.
Ele defende que a tecnologia é viável para o semiárido nordestino. “Nós moramos em uma região em que a precipitação é muito abaixo da média nacional. Aqui chove entre 600 e 900 milímetros quando é um ano bom. E como isso não vem acontecendo na nossa região, reaproveitar qualquer água que você tem é viável. E ainda a gente utiliza para produzir hortaliças que podem ser usadas na alimentação das crianças”, afirma. “É importante fazer que toda a família tenha uma estrutura dessa em sua casa.” (G1)

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